Estado e gestão pública no Brasil: tensões e avanços dos regimes digitais de informação
State and public management in Brazil: tensions and advances of digital information systems
Ana Malin1
Christiana Soares de Freitas 2
RESUMO
O artigo chama atenção para a atual dimensão informacional do Estado, considerada complexa e multifacetada. Recorre aos conceitos de Estado informacional e de regime de informação como ferramentas que possibilitam enquadrar tendências comuns em fenômenos dispersos no quadro da ampla difusão das tecnologias digitais. Baseando-se nesta abordagem, identifica os marcos regulatórios e normativos que afetam a circulação da informação na interface do Estado com a sociedade civil no Brasil, desde o ano 2000. Considera que se cada um, separadamente, tem amplo impacto transversal sobre a condução pública, o conjunto deles indica radical mudança do Estado brasileiro em termos informacionais. Considerando que o funcionamento desse complexo esquema está ainda por ser compreendido, conclui apontando diretrizes para pesquisas que viabilizem a criação de novos instrumentos políticos que fortaleçam a democracia e a cidadania no país.
Palavras-chave: Regime de informação digital; Administração Pública; Estado; Brasil.
ABSTRACT
The article draws attention to the current informational dimension of the complex and multifaceted State. It uses the concepts of informational state and information regime as tools that allow framing common tendencies in dispersed phenomena within the widespread diffusion of digital technologies. Based on this approach, it identifies the regulatory and normative frameworks that affect the circulation of information between the state interface and civil society in Brazil since 2000. It considers that all of them indicates a radical change of the Brazilian State in informational terms. Considering that the operation of this complex scheme is still to be understood, it concludes by proposing directions of research that enable the creation of new political instruments that strengthen democracy and citizenship in the country.
Keywords: Information digital regime; Publica Administration; State; Brazil.
INTRODUÇÃO
O tema da passagem das mediações baseadas em meios de informação analógicos para meios de informação digitais – um processo que há 20 anos era incipiente –, e as mudanças geradas no diagrama de forças e relações de poder da sociedade constitui-se amplo quadro referencial tratado pela literatura das ciências sociais.
No recorte mais especifico dos estudos sobre redes digitais e políticas públicas, encontram-se diversos aspectos relativos às ações públicas, tanto setoriais, territoriais e jurisdicionais, quanto à dimensão política, gerencial e cultural.
Interessa aqui chamar atenção para uma dimensão que permeia todos eles: o fato de que se baseiam em ações e regras sobre – e de – informação, dimensão que, por isto mesmo, é relevante e determinante. Interessa perguntar: como este pano de fundo, hoje comum a todas as intermediações sociais, pode ser percebido? Qual ferramenta analítica pode ser usada?
O pressuposto geral é que há mútuo condicionamento entre mudanças nas regras relativas à produção e circulação das informações e mudanças na ordem política, econômica e sociocultural onde vigem.
Neste artigo, o foco está nas regras constitutivas e reguladoras relativas às informações que circulam e afetam a interface do Estado com a sociedade civil. Estas regras podem ser tratadas como meta política pública, mais do que como variável dependente na elaboração de políticas especificas. Isto porque atingem transversalmente todas as ações públicas, numa espiral ao mesmo tempo desestabilizadora e inovadora.
E, como mostram dados das últimas décadas no Brasil, apontados na parte final deste artigo, as mudanças neste campo foram muitas e importantes. Olhando numa perspectiva de longo prazo, para quais direções apontam a agenda de pesquisa no campo de públicas?
O PANO DE FUNDO: ESTADO E INFORMAÇÃO
A relação entre Estado e informação tem sido tratada e reconhecida por diversos teóricos. Bourdieu a considera como fonte constituinte do poder de Estado. De acordo com o autor,
(…) o Estado é resultado de um processo de concentração de diferentes tipos de capital, capital de força física ou de instrumentos de coerção, capital econômico, capital cultural, ou melhor, de informação, capital simbólico […]. A concentração dos diferentes tipos de capital leva de fato à emergência de um capital propriamente estatal (BOURDIEU, 1996, p. 99).
No Estado moderno, com uma administração pública profissionalizada, de caráter burocrático, ao lado da democratização do poder político, “o modelo moderno de soberania requer um Estado que atue como agente privilegiado de geração, recepção e agregação das informações, gerando um duplo representacional de seus domínios de intervenção territorial, social e simbólica” (GONZÁLEZ DE GOMEZ, 1999, p. 1).
Em outras palavras, Giddens (2008, p. 201) afirma que “o poder administrativo gerado pelo Estado-nação não poderia existir sem a base de informação que são os meios de auto regulação reflexiva”.
Para Weber, o domínio da informação na administração pública burocrática ocorre através do exercício do poder pela esfera legal, pela racionalidade baseada em regras impessoais, pelos registros mantidos por “um quadro de funcionários e escreventes subalternos de todos os tipos” (WEBER, 1982, p. 230).
Por outro lado, o próprio espaço para o surgimento da “informação como um problema e como uma maneira de lidar com a realidade” está ligado à burocratização do Estado e à organização de uma esfera pública onde a informação assume o sentido de “publicidade = tornar público” (MARTELETO, 1992, p. 70).
O reconhecimento do valor da informação no âmbito do Estado tanto é tratado pelo approach político – neste caso, são valorizados temas como publicidade, democracia, accountability e transparência – quanto pelo approach da gestão, como fator gerador de eficiência, eficácia e produtividade (MALIN, 2003).
A questão informacional passa a desempenhar um papel estratégico quando, nas décadas de 1980/1990, acontece um ciclo mundial de reformas do Estado. Estes movimentos reformistas, que expressam o rompimento do consenso político sobre as dimensões burocrática, econômica e do bem-estar social, foram impulsionados por propostas gerencialistas e de governança pública (Diniz, 1996; Abrucio, 1997).
Ambos os casos tinham como pressuposto implícito contar com suporte informacional capaz tanto de permitir o controle de resultados e métricas proposto pelo padrão gerencialista, como de integrar os vários atores autônomos coparticipes da governança pública. No primeiro caso, o ambiente informacional é pressionado por uma massa explosivamente crescente e diversificada de informações e, no segundo, pela necessidade de articulação entre diferentes atores e padrões técnicos nas esparramadas cadeias de coprodução e circulação de informação na sociedade.
Além disto, a crescente disseminação do uso de tecnologias digitais e a grande segmentação funcional e jurisdicional da administração pública permitem ao Estado iniciar e executar múltiplas e descentralizadas ações de informação – criação, processamento, arquivamento, acesso, uso – a partir de qualquer ponto de intervenção. A resultante é um quadro complexo, multifacetado e disperso de problemas (GONZÁLEZ DE GÓMEZ, 2002).
Neste contexto ocorrem esforços teóricos para caracterizar o Estado contemporâneo em termos informacionais e para o desenvolvimento de frameworks analíticos capazes de ajudar a interpretar os fenômenos.
É proposto, então, o conceito de Estado informacional como um novo tipo de sistema político, caracterizado pelo surgimento de uma nova forma de poder, o poder informacional, pela interdependência em relação a outros atores estatais e não estatais e por governar por meio de uma infraestrutura global de informação (BRAMAN, 2006; 2009).
Neste modelo, a informação é empregada como dispositivo de poder de forma deliberada, explícita e sustentada, gerando tensões e disputas pelo controle das informações e suas regras, entre esferas e poderes do Estado. Braman (2009) questiona se estamos diante de mudanças dentro do sistema do Estado, que permanece estável em sua forma, ou na própria natureza do Estado como sistema institucional.
Neste contexto, o modelo de soberania do Estado-nação moderno, no qual ele era o principal produtor, detentor e usuário de informações sobre território, recursos e população, é ameaçado pela entrada de atores e agentes não-estatais – empresas, comunidades, movimentos – no campo informacional. Aí insere-se a problemática da governança pública, da globalização e das agências supraestatais, lidando com novas questões relacionadas à soberania nacional, condicionadas por ações de informação.
O resultado é um campo permanente de tensões acerca de versões e narrativas, aonde o “Estado sabe cada vez mais sobre os indivíduos e os indivíduos sabem cada vez menos sobre o Estado”, o que leva a autora ao alerta de que o “uso das tecnologias digitais pode atualmente reduzir, ao invés de aumentar, a democracia participativa” (BRAMAN, 2009, p. 314-315).
A atualidade e legitimidade dessa afirmação pode ser verificada hoje com os recursos tecnológico- informacionais utilizados para o desenvolvimento de práticas que colocam a democracia em risco, como o uso de bots sociais para forjar debates políticos em redes sociais – muitas vezes encorajando discursos de ódio que violam direitos humanos – e a fabricação de notícias e informações (muitas vezes incluindo conteúdo falso) com o intuito de manipular a opinião pública em movimentos políticos e campanhas eleitorais (ZUBOFF, 2015; WOOLLEY; GORBIS, 2017).
O reconhecimento da dimensão informacional do Estado contemporâneo corresponde a uma mudança de nível de percepção e interesse dos assuntos no campo da informação: significa pensar a informação como força e poder constituinte da sociedade, moldando ativamente o contexto e não mais sob a perspectiva de um recurso funcional, setorial ou organizacional. A informação é afetada pelo contexto, assim como afeta o contexto.
A partir do reconhecimento deste poder, ganham visibilidade questões como assimetrias de informação – entre governantes e governados, entre grupos sociais, entre segmentos do capital –, transparência, acesso público à informação, exclusão digital, privacidade, fakes news, entre outras.
Frente à abundância, transversalidade e dispersão das ações relativas a informações, qual referencial poderia ajudar a tornar visível e inteligível o caos espelhado no dilúvio de dados?
REGIME DE INFORMAÇÃO
A partir do início dos anos 2000, no campo de estudos da Ciência da Informação, ganha força o conceito de regime de informação, como “um conjunto mais ou menos estável de redes sócio-comunicacionais, formais e informais, nas quais as informações podem ser geradas, organizadas e transferidas de diferentes produtores, através de muitos e diversos canais” (GONZÁLEZ DE GÓMEZ, 2002, p. 34).
O conceito de regime, originário do campo das relações internacionais, é entendido como a estrutura da organização de um conjunto de princípios, normas, regras e procedimentos, em torno dos quais convergem expectativas dos atores.
Os princípios são crenças em fatos, causas e questões morais. As normas são padrões de comportamento definidos em termos de direitos e obrigações. As regras são prescrições ou proscrições especificas para a ação. Os procedimentos para tomada de decisões são práticas predominantes para fazer e executar a decisão coletiva (KRASNER, 2012, p. 94).
Regime de informação é conceitualmente aplicado a um escopo ainda mais abrangente, incluindo atores, práticas e interesses que o circundam e afetam.
“(…) questões de como o poder é exercido em e através das relações sociais mediadas pela informação, como o domínio sobre a informação é alcançado e mantido por grupos específicos, e como formas específicas de dominação
– especialmente de raça, classe, sexo e gênero – estão implicadas no exercício do poder sobre a informação (FROHMANN, 1995, p. 5 apud GONZÁLEZ GÓMEZ, 2012, p. 51).
O regime de informação entra em transformação quando ocorrem significativas alterações em regras e direitos e nos mecanismos de escolha social. As mudanças envolvem destruição de instituições existentes e criação de novas, e também coordenação de expectativas, prioridades e percepções em torno de pontos focais das políticas de informação (BRAMAN, 2006).
O conceito, ao unificar num mesmo domínio a pluralidade de canais e meios informacionais, ajuda a identificar tendências comuns em processos dispersos, oferece novos parâmetros para avaliar o impacto das tecnologias digitais e para se pensar instituições, ações e instrumentos político novos.
A teoria de regime foi uma das primeiras ferramentas teóricas usadas para abordar questões informacionais, desde que passaram a ser vistas como definidoras dos rumos da sociedade. Em outras palavras, uma necessidade recente para lidar com uma antiga questão. Se a informação, em seu sentido mais amplo, foi sempre crucial a todas as sociedades, “(…) o termo informacional indica o atributo de uma forma específica de organização social em que a geração, o processamento e a transmissão da informação tornam-se fontes fundamentais de produtividade e poder devido às novas condições tecnológicas” (CASTELLS, 1999, p. 47).
Ao pensamos nos inúmeros fluxos de informação que nos circundam e dos quais participamos, sejam institucionais, profissionais, culturais ou econômicos, nos damos conta que eles, por mais que sejam dispersos, múltiplos e fragmentados, possuem estruturas e formas especificas (FROHMANN, 1995).
Regime de informação apresenta-se como um instrumento analítico que ajuda a ver esta zona cinza através de seus componentes, como os atores, a infraestrutura, as políticas e as diretrizes de ação. Tanto aplicável num nível de estudo específicos sobre arranjos produtivos, políticas científicas, segurança pública, segmentos industriais (COSTA, 2016), quanto no estudo de instituições nacionais e globais.
Com isto, gera-se um efeito “desnaturalizador” da categoria informação tratada como um bem livre. Há intencionalidade na sua produção e guarda: as informações não estão nas “nuvens”, mas em computadores de gigantescas corporações; a transparência não é um atributo direto dos conteúdos, mas resultado das condições em que ocorrem a produção, o processamento, arquivamento, acesso e uso da informação.
Como chama a atenção Latour:
A produção da informação permite resolver de forma prática, através de operações de seleção, extração e redução, a contradição entre a presença num lugar e a ausência deste lugar. É impossível compreendê-la sem levar em consideração as instituições que permitem o estabelecimento dessas relações de dominação e os veículos materiais que viabilizam seu transporte e movimentação. Um signo não leva a outro signo, mas a um trabalho de produção tão concreto, tão material quanto a extração de urânio (LATOUR, 1996, p. 26).
Sendo as configurações regulatórias e normativas institucionais uma das principais dimensões para os estudos dos regimes de informação, como podemos vislumbrar este quadro no Brasil hoje?
Regime de informação: marcos regulatórios e normativos atuais no Brasil
Do ponto de vista político, temos como marco principal a redemocratização do país. A Constituição de 1988 assegura ao cidadão o direito ao acesso às informações de seu interesse dos órgãos públicos. Do ponto de vista das tecnologias digitas, foi também em 1988 que o Laboratório Nacional de Computação Científica, LNCC, no Rio de Janeiro, faz a primeira conexão com a Universidade de Maryland, nos Estados Unidos. Neste mesmo ano, uma organização da sociedade civil, o Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase) colocou no ar a rede Alternex, primeira rede privada e independente das universidades.
O quadro abaixo, sem pretensão de exaustividade e numa perspectiva descritiva, dá uma dimensão da quantidade e amplitude dos novos marcos regulatórios e normativos relativos à informação que circulam na interface do Estado com a sociedade civil, introduzidos no Brasil desde 2000. São vinte dispositivos que abarcam transversalmente setores, jurisdições, funções, poderes e esferas do nosso Estado.
Destaca-se, como pano de fundo do período, que em 2000 existiam no país 23 milhões de linhas móveis para 169 milhões de habitantes; hoje, em 2018, são 234 milhões de linhas para uma população de 208 milhões. Consequentemente, o alcance direto ou indireto das inovações regulatórias afetou padrões de comportamento na sociedade brasileira, assim como o diagrama de forças políticas.
Quadro 1 – Marcos regulatórios e normativos
Ano | Marcos regulatórios e normativos |
2000 | Criação do Programa de Governo Eletrônico (Decreto Presidencial 3/04/ 2000) |
2000 | Aprovação da Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar nº 101, de 04/05/2000) |
2000 | Votação eletrônica em todos os municípios brasileiros |
2003 | Criação do Comitê Gestor da Internet (Decreto Nº 4.829, de 3/09/2003) |
2004 | Criação do Portal da Transparência |
2004 | e-PING – Padrões de Interoperabilidade de Governo Eletrônico (Documento de Referência 31/05/2004 do Comitê Executivo de Governo Eletrônico) |
2006 | Dispõe sobre Informatização do processo judicial (Lei nº 11.419, 19/12/2006) |
2008 | Observatório de Despesa Pública – indicadores gerenciais (Portaria n.º 1.215, 25/ 06/2009) |
2008 | Infraestrutura Nacional de Dados Espaciais (Decreto Presidencial nº 6.666, 27/11/2008) |
2008 | Urnas eletrônicas com leitura biométrica em eleições municipais – TSE |
2009 | Informações sobre execução orçamentária e financeira em tempo real (Lei Complementar nº 131, de 27/05/2009) |
2011 | Plano de Ação Nacional sobre Governo Aberto (Decreto s/nº de 15/09/ 2011) |
2011 | Lei de Acesso à Informação (Lei 12.527 de 18/11/2011) |
2011 | Portal da Legislação da Presidência da República (Portaria nº 1.492, de 5/10/2011) |
2012 | Comissão Nacional da Verdade (Lei nº 12.528 de 18/11/2011) |
2014 | Marco Civil da Internet (Lei nº 12.965 de 23/04/2014) |
2015 | Processo Eletrônico Nacional – PEN/SEI (Decreto n° 8.539, de 08/10/ 2015) |
2015 | Programa de Identificação Biométrica do Eleitor (Resolução TSE nº 23.440 de 19/03/2015) |
2016 | Política de Governança Digital (Decreto nº 8.638, 15/01/2016) |
2018 | Proteção de dados pessoais (Lei nº13.709 de 14/08/2018) |
Fonte: Elaboração própria, 2018.
Cada um destes marcos, por si, tem impacto transversal sobre a condução de políticas públicas, sobre padrões da governança e da administração e pública, do nível micro ao nível macro e, também, sobre os espaços e as formas de participação do cidadão na vida política do país.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Pode-se afirmar que os últimos 20 anos mostram significativa consolidação do regime institucional de informação, com princípios, normas, regras e procedimentos em torno dos quais convergem expectativas dos atores da sociedade brasileira. Sobretudo considerando uma situação informacional prévia, diagnosticada como caótica, de ausência de políticas e procedimentos orientadores, lacunas, opacidade e de desconhecimento da administração pública sobre a própria administração pública (DAMATTA, 2011; JARDIM, 1998; MALIN, 1988).
Interessa compreender como este amplo conjunto de inovações sociais afeta aspectos da nossa tradição política, considerada, por intérpretes clássicos do Brasil, como sendo de matriz patrimonialista, centralizadora, autoritária e ancorada na cultura do segredo (FAORO, 1996; HOLANDA, 1991; BRESSER PEREIRA, 2001).
Se o uso da informação torna possível o exercício de diferentes formas de poder, levar em conta estes marcos regulatórios informacionais como uma força constitutiva da sociedade brasileira conduz a muitas questões de trabalho no campo de públicas. Destacamos duas delas:
- Como responder à necessidade de incorporá-los no nível micro e macro das análises do campo de públicas, visando dar efetividade aos serviços e políticas públicas no sentido de tornar, de fato, o direito de cidadania universal acessível à população brasileira no país?
- Como usá-los no sentido de reduzir as assimetrias de informação entre grupos de raça, sexo, gênero e classes econômicas em um país tão desigual e heterogêneo como o nosso?
O esforço para caracterizar nosso Estado contemporâneo em termos informacionais é um projeto de longo prazo, interdisciplinar e complexo, mas indispensável de ser realizado. Sobretudo, levando em conta o alerta dado por Walter Benjamin que afirma que
(…) no poder (…) está presente uma capacidade misteriosa de amedrontar e tornar perplexos os seres sobre os quais o poder se exerce: os que mandam possuem códigos, mas os que recebem as ordens não podem conhecer os princípios em que tais ordens se baseiam e se sentem regidos por normas mais ou menos inapreensíveis. (BENJAMIN apud KONDER, 1988, p. 58)
A maneira como funciona (e como não funciona) esse complexo esquema de informação, agendas, sanções e/ou correções de rumo está, ainda, por ser compreendida. E deste entendimento depende, em grande parte, a direção na condução democrática e de justiça social em nosso país.
—
- Professora Associada da Faculdade de Administração e Ciências Contábeis e do Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação ECO UFRJ/ IBICT da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). E-mail: anamalin@terra.com.br
- Professora Associada do Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Direito e do Curso de Graduação do Departamento de Gestão de Políticas Públicas da Faculdade de Economia e Administração (FACE) da Universidade de Brasília (UnB). Pesquisadora do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Democracia Digital (InCT.DD). E-mail: christiana@gmail.com.
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